Após breve leitura de um pequeno livro de homenagem a Teixeira de Pascoaes pelos escritores da "Tertúlia "Rio de Prata", conheci, (re)vivi longinquamente, sem recordar em consciência, presenciar as sombras do Marão, a mátria-natura do Gêres, panteão de Deus, uma força única vinda do Alto e tão presente no baixo.
Nós ignoramo-lá; pior, marginalizamos a nosso própria essência, renegamos qualquer sinal manifestado, continuando a existir até à putrefacção da carne.
Diz o Espírito de Marânus, que "o homem existe, enquanto devia viver".
Definição precisa; o homem existe enquanto animal, pela sua condição de ser existente, mas logo que se extingue o suspirar, deixa de existir.
Contudo, nunca chegou a viver. Só a Vida tem capacidade de imortalizar o Ser, e não a existência. Já diz Fernando Pessoa:
"(...)
Vive porque a vida dura,
E nada na alma lhe diz
Mais que a lição da raiz-
Ter por vida a sepultura."
Esta durabilidade da vida, trata-se da mera condição existencial do homem.
Talvez a fórmula de vivermos esteja contida nas sábias e metáforicas palavras de Agostinho da Silva, "não deveremos ter, deveremos ser".
Ser é viver "como", enquanto existir será viver "com" ou "sem". Talvez existir "com" a Natureza nos reserve um pouco de lembrança, de saudade de onde viemos, e nos abandone esta constante "saudade de ter Saudade" (Agostinho da Silva).
sexta-feira, julho 21, 2006
Desvaneios duma noite quente de verão
terça-feira, julho 18, 2006
Pequena lembrança de Teixeira de Pascoaes
Screvo
Morto-vivo,
Respiro ar
Mas não
Vivo,
Deixo-me
Existir
Disperso
Da Natureza
Que Marão
(A)guarda.
Fútil vivência,
A morte presença
Do esquecido passado
Escondido,
Perdido,
Ignorado,
Pelos mortos-vivos,
Homens nascidos,
Paridos
Cegos órfãos
Da Mãe-Natura.
Francisco Canelas de Melo
Morto-vivo,
Respiro ar
Mas não
Vivo,
Deixo-me
Existir
Disperso
Da Natureza
Que Marão
(A)guarda.
Fútil vivência,
A morte presença
Do esquecido passado
Escondido,
Perdido,
Ignorado,
Pelos mortos-vivos,
Homens nascidos,
Paridos
Cegos órfãos
Da Mãe-Natura.
Francisco Canelas de Melo
sexta-feira, julho 14, 2006
A Noite
Sepulcro repleto de pedras e de trevas
onde um rei chora perdidas rosas
A noite é um jardim de ossos
onde num banco de pérolas o corpo dia
tem os membros paralisados e frios
Só os olhos se movem
Ap longe o rei dorme por entre paredes de
hera, colunas de mármore azul
A noite é um arco, um ventre que conserva
o dia oculto
numa torre de brumas e de mistério
"Arte Régia" de António Cândido Franco
onde um rei chora perdidas rosas
A noite é um jardim de ossos
onde num banco de pérolas o corpo dia
tem os membros paralisados e frios
Só os olhos se movem
Ap longe o rei dorme por entre paredes de
hera, colunas de mármore azul
A noite é um arco, um ventre que conserva
o dia oculto
numa torre de brumas e de mistério
"Arte Régia" de António Cândido Franco
Teoria da Saudade
Na língua portuguesa há um certo número de palavras, altamente expressivas do que a nossa sensibilidade possui de mais íntimo e característico, e, por isso, sem equivalentes nas outras línguas.
Mas nós não conhecemos ainda uma célebre palavra, animada pelos dois princípios religiosos que definem a alma pátria.
Não precisamos de reunir vários sentimentos comuns dos portugueses, para com eles desenharmos o seu carácter moral. Conhecemos um que o define por completo. Refiro-me à Saudade.
Analisai-a e vereis logo os elementos que a formam: desejo e lembrança, conforme Duarte Nunes de Leão; gosto e amargura, segundo Garrett.
O desejo é a parte sensual e alegre da Saudade, e a lembrança representa a sua face espiritual e dolorida, porque a lembrança inclui a ausência duma cousa ou dum ser amado, que adquire presença espiritual em nós.
A dor espiritualiza o desejo, e o desejo, por sua vez, materializa a dor. Lembrança e desejo confundem-se, penetram-se mutuamente animados da mesma força vital e assimiladora; e precipitam-se depois num sentimento novo, que é a Saudade.
Pelo desejo e pela dor, a Saudade representa o sangue e a terra de que descende a nossa Raça.
Desta forma, aqueles dois ramos étnicos que deram origem aos povos latinos, encontraram na Saudade e, portanto, na alma portuguesa, a sua divina síntese espiritual.
A Saudade pelo desejo (desejar é querer, e querer é esperar), em virtude da própria natureza do desejo, é também a esperança, assim como é lembrança pela dor.
Pela esperança e pelo desejo, a Saudade é Vénus; pela dor e pela lembrança é a Virgem Dolorosa.
As duas Deusas confundem-se neste sentimento essencial dos lusíadas, originando um nova Divindade que é o símbolo vivo da alma pátria...
Teixeira de Pascoes
In "Arte de Ser Português", Renascença, Porto,
1915
Mas nós não conhecemos ainda uma célebre palavra, animada pelos dois princípios religiosos que definem a alma pátria.
Não precisamos de reunir vários sentimentos comuns dos portugueses, para com eles desenharmos o seu carácter moral. Conhecemos um que o define por completo. Refiro-me à Saudade.
Analisai-a e vereis logo os elementos que a formam: desejo e lembrança, conforme Duarte Nunes de Leão; gosto e amargura, segundo Garrett.
O desejo é a parte sensual e alegre da Saudade, e a lembrança representa a sua face espiritual e dolorida, porque a lembrança inclui a ausência duma cousa ou dum ser amado, que adquire presença espiritual em nós.
A dor espiritualiza o desejo, e o desejo, por sua vez, materializa a dor. Lembrança e desejo confundem-se, penetram-se mutuamente animados da mesma força vital e assimiladora; e precipitam-se depois num sentimento novo, que é a Saudade.
Pelo desejo e pela dor, a Saudade representa o sangue e a terra de que descende a nossa Raça.
Desta forma, aqueles dois ramos étnicos que deram origem aos povos latinos, encontraram na Saudade e, portanto, na alma portuguesa, a sua divina síntese espiritual.
A Saudade pelo desejo (desejar é querer, e querer é esperar), em virtude da própria natureza do desejo, é também a esperança, assim como é lembrança pela dor.
Pela esperança e pelo desejo, a Saudade é Vénus; pela dor e pela lembrança é a Virgem Dolorosa.
As duas Deusas confundem-se neste sentimento essencial dos lusíadas, originando um nova Divindade que é o símbolo vivo da alma pátria...
Teixeira de Pascoes
In "Arte de Ser Português", Renascença, Porto,
1915
domingo, julho 09, 2006
"Entre o que pensamos e o que escrevemos vai
aquele trágico e fecundo afastamento, que não
nos deixa escrever um só livro, mas muitos e
sempre, até que a morte suprima a distância
entre o corpo e a alma"
Leonardo Coimbra
aquele trágico e fecundo afastamento, que não
nos deixa escrever um só livro, mas muitos e
sempre, até que a morte suprima a distância
entre o corpo e a alma"
Leonardo Coimbra
segunda-feira, julho 03, 2006
BULBUL de João Carlos Raposo Nunes
BULBUL. Nome persa do rouxinol, e que na Índia é dado ao Lanius boulboul Lath., de que há variedades, de canto muito doce.
O Bulbul e o môruôni são a melodia das espessuras, dos palmares e arecais de Goa.
Alberto Osório de Castro in O Sinal da Sombra, 1923
É assim que se inicia esta excelente obra poética do Amigo João Carlos Raposo Nunes.
Amigo na plenitude total da palavra, Irmão no maior sentido da palavra de Irmandade e tudo o que ela abarca e Mestre, que tem a mestria dos Grandes, de ensinar não do Alto, mas junto de nós, partilhando num transmitir-receber...
Discípulo de Agostinho da Silva, foi nomeado pelo filósofo cidadão do mundo, Alferes da Pátria e Alferes do V Império.
Assim em jeito de singela homenagem transcrevo o prelúdio do Mestre Agostinho à obra citada:
IMPÉRIO SÃO FILIPE DO ESPÍRITO SANTO
Castelo Real
Setúbal-Portugal
A Arrábida espera. Deixamos por agora de considerar e falar do esporão de Palmela, pois dêle tem ido tomando conta Santiago, seu Senhor e Dono, e, como tem de ser, seu inspirador de futuro. Partiremos das arribas de Setúbal e veremos, como apoio e empurrão de largada, a um tempo o Grupo que Raposo Nunes tem congregado em sua Arca do Setubalense, e, como mais perto e excelente incitamento à empresa, o livro de Poemas sob o título de BULBUL ou seja o Rouxinol de Oriente, em que, num perfeito domínio da linguagem e de tôda a musicalidade exterior do verso, lhe dá equilibrado vertebrar a musicalidade interna de ver todo o passado como projecto futuro, de se tomar saudade como valente desejo a premonição de que virá tempo em que olharemos a Serra como triângulo para além da terra e à terra vinculado de que são extremos Europa, Ásia e África e em que nos ajoelharemos perante o Brasil, criação máxima dos Portugueses e modelo que se mostrará de todo o mundo a vir, de um mundo novo nem avaro nem triste; não esqueceremos o patrono geral, místico dos céus sem que o mundo esqueça, Frei Agostinho da Cruz, com sua cela de monte e sua gineta de companhia, nem esquecerei eu o trabalho de Orlando Ribeiro, o primeiro que, com sua implícita metafísica, pôs mais ordem no que se pensaria caos do que jamais fará o moderno progresso das fractais, em que matemática irá a domínios de que estava esquecida mas que felizmente nunca avançará bastante para que da vida desapareça o que a faz de interesse, isto é, o inesperado da verdadeira e suprema criatividade; não esqueceu ao Autor, sempre na melhor inspiração, olhar em Sebastião da Gama o sentido das viagens que se julgam impossíveis e o sacrifício na batalha que todos têm julgado desastrosa, mas que atravou os Turcos, firmou economia do Brasil e amparou em provações gente do outro lado do Atlântico; à Senhora do Cabo chegaremos e aí estará a recordação do génio analítico de Keil do Amaral ante o genético génio do Povo.
Por agora ficaremos em Setúbal, para que todos possamos discutir e entender neste Império, de que tem de ser Alferes Raposo Nunes, o canto do Bulbul, agora ave mesmo. O faremos pensando no Castelo que homenageou o Rei Filipe e faremos que desta vez perceba êle como é o Entre-Sado-e-Tejo a verdadeira Capital do que pelo mundo tenha tido semeadura ibérica. Não nos faltará a nenhum de nós audácia e reflexão: sabemos que a loucura só vale quando não nos falta o juízo. A tudo vamos, connosco venham.
Agostinho da Silva
Agosto 90
TÚBAL
Guardo o cantar do Bulbul
Como um segredo de séculos.
Da Índia à Arrábida
ausculto o piar da sombra.
A Nau da Saudade vem carregada de Lua.
Aberta a Arca do Ocidente
a luz emanada tem a forma
espectral da Ausência.
Avisto Cam, Sem e Jafé
a Arrábida é um triângulo
Europa, África e Ásia.
Ajoelho frente ao Brasil,
nu
no ponto mais alto da serra
à espera do homem de todo o mundo.
Nu
no prolongamento etéreo até ao regresso do Rei
insensível à vida e à morte,
pronunciando o Mantra: -«a liberdade é o próprio espírito»
Subscrever:
Mensagens (Atom)